Os Salmos têm uma eficácia especial para suscitar nas almas o desejo de todas as virtudes”, diz Santo Atanásio. De alguma maneira, todas as páginas da Bíblia possuem esse dom, mas de forma especial os Salmos, pois chegam facilmente a comover os corações e a inflamar sentimentos de piedade

Pe. Rafael Ramón Ibarguren Schindler*, EP

No centro da Sagrada Escritura está o mistério da Encarnação. Por isso, todo o Antigo Testamento anseia e celebra o advento do esperado das nações, Jesus Cristo, o Senhor.

Após a Encarnação, e assim o será até a consumação dos séculos, a presença sacramental de Jesus em seu corpo e em seu sangue adoráveis, é uma constante na vida da Igreja; é assim que o mistério redentor se atualiza, nutrindo as almas com o viático necessário para chegar ao céu.

Não surpreende, pois, que encontremos nos Salmos numerosas referências, sempre implícitas, ao Sacramento do Altar. Vamos às citações.

O Salmo 04 é um salmo de ação de graças. Diz no versículo 06: “oferecei sacrifícios legítimos”. E no 08, o salmista exulta dizendo: “Mas tu, Senhor, puseste em meu coração mais alegria que se abundasse em trigo e em vinho”. O pão e o vinho são, precisamente, as espécies que são o objeto de transubstanciação na Celebração Eucarística, “sacrifício legítimo” por excelência.

O Salmo 22 celebra o Bom Pastor que “repara minhas forças” (2). E o versículo 05 reza: “Preparas uma mesa diante de mim (…) e meu cálice transborda”. Acaso as referências ao altar e ao cálice não nos fazem pensar em nossa Missa, celebração privilegiada onde se restauram as forças?

Por outro lado, o Salmo 25 retrata a oração confiada do inocente. O versículo 08 confessa: “Senhor, eu amo a beleza de sua casa, o lugar onde reside a sua glória”. É uma alusão aos templos, aos altares, aos tabernáculos, onde reside a presença real de Cristo glorificado.

No Salmo 35 se enfrentam a depravação do malvado e a bondade de Deus. Os versículos 09 e 10 dizem que os humanos “se nutrem do saboroso de tua casa, lhes dá a beber da torrente de tuas delícias, porque em ti está a fonte viva, e tua luz nos faz ver a luz”. Como não ver neste trecho uma alusão à Eucaristia, mistério luminoso que contêm em si todas as delícias?

Já o Salmo 41 desperta a nostalgia do templo e a sede do próprio Deus: “Assim como o cervo procura pelas correntes das águas, assim suspira a minha alma por ti, ó Deus! A minha alma tem sede de Deus, do Deus vivo”. O cervo que mata sua sede em uma torrente é um dos símbolos mais sugestivos da comunhão sacramental. O texto deste salmo dá a letra do célebre cântico eucarístico “Sicut Cervus”. (clique abaixo para ouvir esse cântico)

Na história da salvação é uma constante que a infidelidade do povo contraste com a bondade sem trégua de Deus. O extenso Salmo 77 em seus versículos 19, 20, 24 e 25 canta: “Falaram contra Deus: Poderia Deus preparar-nos uma mesa no deserto? Ele feriu a rocha, brotou água e derramaram as torrentes; poderá também dar-nos pão, prover de carne ao seu povo? (…) Fez chover sobre eles o maná, lhes deu um trigo celestial, e o homem comeu o pão dos anjos”. Aqui, a prefiguração da Eucaristia é claríssima.

O Salmo 103 é um hino para o Criador. Nos versículos 14 e 15 se diz: “Ele tira pão dos campos e vinho que alegra o coração”. São as ofertas que na Missa serão transformadas em seu corpo e em seu sangue.

A Ação de Graças é a nota tônica do Salmo 106. O versículo 09 nos diz que Deus “acalmou a sede dos sedentos e aos famintos cumulou de coisas boas”. Pois isso é o que acontece quando uma alma se aproxima da Mesa Eucarística.

Rei David, autor de vários salmos

Também o Salmo 110 é de ação de graças. O fiel canta “Ele dá alimento aos seus fiéis, recordando sempre a sua aliança” (versículo 05). Pensemos no cálice da nova e eterna aliança e no mandato: façam isto em memória de mim.

Na mesma clave “eucarística” reza o Salmo 115 em seu versículo 04: “Alcançarei o cálice da salvação, invocando seu nome”. Como não ver nesta citação uma referência ao cálice que se ostenta depois da consagração do vinho?

O Salmo 131 celebra as promessas feitas à casa de Davi. Os versículos 15 e 16 rezam: “Abençoarei as suas provisões, aos seus pobres saciarei de pão, vestirei os seus sacerdotes de gala, e seus fiéis aclamarão”. O salmista parece ter uma antevisão do Sacrifício Eucarístico com seu ofertório e comunhão, celebrada por um ministro ornamentado que anuncia e proclama com os fiéis.

Caro leitor; em um passeio rápido, reunimos essas “pérolas eucarísticas” de dentro dos salmos. Que elas toquem nossos corações e mentes, e concorram para dar-nos maior fervor ao mistério eucarístico que tanto supera as expectativas dos profetas e dos santos da Antiga Lei. Maria Santíssima, que deu sua carne e seu sangue para a concepção do Filho de Deus, nos faça insaciáveis adoradores do Pão dos Anjos.

Mas… Pão dos Anjos? Acaso os anjos comungam? Claro que não. Para eles, a Eucaristia é o “Pão dos Homens”! O fato de que podemos receber a comunhão enche os anjos de santa inveja; pois eles veem, adoram, assistem e servem ao Senhor, mas não alcançam essa união intimíssima que somente se alcança quando se recebe em seu peito a Sagrada Comunhão.

*Conselheiro de Honra da Federação Mundial das Obras Eucarísticas e da Igreja.

Fonte: Apostolado do Oratório