A 25 de março de 1646, Dom João IV solenemente consagrou o seu Reino à Virgem Maria. A Coroa Real, tendo sido ofertada oficialmente à Mãe de Deus, não mais foi cingida pelos Monarcas de Portugal.

Naquele ano do Senhor, de 1646, em Portugal, logo ao raiar do dia 25 de março, festividade litúrgica da Anunciação do Anjo à Nossa Senhora, os sinos do Santuário de Vila Viçosa, no Alentejo, repicaram com toda sua força e sonoridade, sendo acompanhados pelos outros numerosos sinos dos campanários dos conventos, igrejas e capelas de toda a região. Algo de imenso significado espiritual e histórico estava para ocorrer.

Em 1640 o Rei Dom João IV restaurou a independência de Portugal, que se estivera sob o governo da Espanha. Como gesto de gratidão à Virgem Maria, em 1646, consagrou-lhe Portugal e todas as suas províncias ultramarinas.

Nessa festividade a Igreja celebra a mensagem do Altíssimo transmitida pelo Arcanjo São Gabriel à Virgem, de que Ela fora a escolhida para ser a Mãe do Messias tão esperado por Israel. “Eis aqui a escrava do Senhor”, foi sua resposta, ao mesmo tempo magnífica e humilde.

Naquela manhã, logo ao soar das trombetas e ao rufar dos tambores, teve início o cortejo. À frente vinha desfraldado o pendão do Reino, ostentando as cinco Cruzes e as cinco chagas de Cristo crucificado. Seguiam-se cavaleiros e soldados, abrindo caminho para os Prelados, religiosos, e membros da nobreza que conduziam Dom João IV ao Santuário. Ali, após a Santa Missa, o Reino de Portugal foi solenemente consagrado à Santíssima Virgem.

Nessa consagração, entretanto, o Rei Dom João IV quis acrescentar também sua vigorosa devoção outra prerrogativa de Maria Santíssima: sua Imaculada Conceição, pela qual foi ela concebida no seio de sua mãe Santana, isenta do pecado original. A partir desse dia, tendo a Coroa Real sido oferecida à Mãe de Deus, os monarcas portugueses deixaram de cingi-la.

A partir de então, as cerimônias de ascensão dos príncipes herdeiros ao trono não mais comportavam a sua Coroação, como era praxe nos demais reinos da Cristandade. Em Portugal a subida de um novo monarca ao trono era denominada Aclamação. A Coroa permanecia ao lado do Trono, sobre uma almofada, pois de fato, ela pertencia à Virgem.

Em 1646 Dom João IV consagrou Portugal à Santíssima Virgem; em 1917 a própria Santíssima Virgem apareceu em Portugal a três pastorinhos, para através deles maternalmente chamar o mundo à conversão e ao Reino de Cristo. (Santuário de Vila Viçosa – Quadro da Consagração, em azulejos)

Desde os primeiros séculos da cristandade numerosos Padres da Igreja com frequência expressaram sua crença na absoluta imunidade do pecado, mesmo o original, concedida à Virgem Maria, logo ao ser concebido no seio de sua mãe, Santana. Santo Efrém, exalta Maria “como tendo sido sempre, de corpo e de espírito, íntegra e imaculada”. E São Cirilo de Jerusalém, a comparam com Eva antes do pecado.

Não obstante, no decorrer do século XVII, a crença na Imaculada Conceição de Nossa Senhora, embora piedosamente celebrada entre os fiéis, foi objeto de certas discussões entre teólogos.

Por essa razão o Rei Dom João IV, como precaução, condicionava sua devoção e disposição de defender a doutrina da Imaculada Conceição de Maria ao ensinamento da Santa Igreja, Ou seja, se no futuro a Igreja viesse a definir um ensinamento diferente sobre essa crença, o monarca estaria pronto a aceitá-lo.

Ao longo dos séculos, entretanto, os pronunciamentos dos Papas foram se alinhando todos no reconhecimento da ortodoxia da crença na Imaculada Conceição.

Em 1447, por exemplo, o Papa Nicolau V aprovou a festividade da Conceição de Maria, com Missa especial para tal solenidade. A extensa série de pronunciamentos pontifícios nesse sentido culminou em 1854, quando o Papa Pio IX proclamou solenemente o dogma da Imaculada Conceição de Santíssima Virgem.

Moedas e placas de bronze

Em 1648 Dom João IV mandou cunhar e pôs em circulação moedas de ouro e de prata, tendo estampada no reverso a imagem da Santíssima Virgem, coroada de sete estrelas, sobre o globo e a meia-lua, tendo aos lados o sol, o espelho, a casa de ouro, a arca da aliança, fonte saúde dos enfermos. Esses símbolos e referem a títulos com que é honrada na Ladainha Lauretana. Sua imagem é também circundada pelo título latino Tutelaris Regni (Protetora do Reino).

Com tais moedas efetuou Dom João IV o pagamento de seu primeiro de tributo anual ao Santuário de Vila Viçosa.

Além disso, em 1654 decretou Dom João IV que “em todas as portas e entradas das cidades, vilas e lugares de seus Reinos” fosse colocada uma afixada uma proclamação para os séculos futuros, cuja inscrição exprimisse a ardorosa fé do povo português na Imaculada Conceição.

Desse modo, em atenção a tal ordem, tanto no Reino quanto nas colônias nos mais distantes pontos do globo, placas de bronze ou lapides de mármore, foram devidamente postas em pontos mais visíveis das vias e praças públicas.

Na Bahia: placa de bronze no Palácio dos Governadores

Em 1654, o Governador-Geral do Brasil, Dom Jerônimo de Ataíde cumpriu a determinação de Dom João IV, afixando uma vistosa placa de bronze na fachada da Sede do Governo.

O texto da proclamação, com original em latim, e numerosas palavras abreviadas, tem a seguinte tradução em português:

“Inscrição destinada à eternidade. A Imaculada Conceição da Bem-Aventurada Virgem Maria. Dom João IV, Rei de Portugal, juntamente com as Cortes dos Estados do Reino, em ato público obrigou-se por voto solene a si e aos seus reinos tributários a um tributo anual, e prometeu um juramento perpétuo que ele havia de defender a Mãe de Deus, concebida sem pecado original e tomada por padroeira e Protetora do seu Reino. E para perpetuar essa piedade de Portugal, mandou esculpir esse preito e juramento e lâmina de bronze, para memória perene no ano de Nosso Senhor Jesus Cristo de 1646, 6ª de seu Império”.

Desse modo, ao longo dos anos e dos séculos, a cada festividade de Anunciação de Nossa Senhora, a 25 de março, os sinos do Santuário português de Vila Viçosa continuam a repicar, como o vêm fazendo há mais de três séculos, evocando também para muitos fiéis aquela consagração feita à Virgem pelo heroico e piedoso monarca Dom João IV.

A esse repicar de se juntam igrejas e santuários espalhados por todo o mundo, devotados de modo especial ao culto da Imaculada Conceição. Deve-se destacar as celebrações das multidões que diariamente acorrem ao Santuário de Lourdes, na França. Esse Santuário, encontra-se edificado sobre a gruta na qual Virgem apareceu em 1858 e disse de si própria: “Eu sou a Imaculada Conceição”.

No Brasil, um singelo oratório onde inicialmente foi venerada da imagem de Nossa Senhora da Conceição, retirada em 1717 das águas do Rio Parnaiba, deu origem a uma Capela. Centro de intensa devoção popular, nesse abençoado lugar floresceu o Santuário da Padroeira e Rainha do Brasil, expressão maternal proteção dispensada pela Imaculada Conceição a seus filhos lusos e brasileiros.

O Brasil de Nossa Senhora da Conceição Aparecida

Em conferência proferida em São Paulo, na festividade da Padroeira do Brasil, em 12 de outubro de 1972, assim se expressava o Prof. Plinio Corrêa de Oliveira:

“Pode-se dizer que o Brasil é um feudo de Nossa Senhora enquanto concebida sem pecado original, quer dizer, enquanto Imaculada Conceição, aparecida no Rio Paraíba. A invocação Aparecida é secundária. Ou seja, ela se desprende naturalmente à maneira de ramo saído do tronco. O conceito principal é o de Imaculada Conceição.

O fato dessa imagem ter sido encontrada no século XVIII é de grande significado para o Brasil. Naquela época, embora francamente admitido pela maioria dos católicos, o dogma da Imaculada Conceição ainda não estava definido. E professar então fé nesse augusto privilégio de Nossa Senhora, constituía distintivo de requintada ortodoxia.

Ora, exatamente a partir do aparecimento dessa imagem, um século inteiro antes da definição dogmática, foi o Brasil colocado sobre o patrocínio da Imaculada Conceição. Isto indica um chamado especial da Mãe de Deus para nossa Pátria e é motivo de intenso júbilo para todos os brasileiros devotos da Santíssima Virgem”.


Pesquisa e redação de Pe. Colombo Nunes Pires, EP

Obras consultadas
  1. “Efemérides da Freguesia de Nossa Senhora da Conceição da Praia”, de Mons. Manoel de Aquino Barbosa, Salvador, 1970.
  2. “Pequeno Ofício da Imaculada Conceição Comentado”, João S. Clá Dias, Artpress, São Paulo, 1997.
  3. http://portugalglorioso.blogspot.com/2014/12/imaculada-conceicao-padroeira-e-rainha.html