Bela como todas as passagens do Evangelho, a Liturgia do dia 2 de fevereiro focaliza o resgate do Menino Jesus e a Purificação de Nossa Senhora. Esses dois atos se passam dentro da casa do Senhor, o Templo de Jerusalém.

Em Jerusalém, havia um homem chamado Simeão, o qual era justo e piedoso..

   É bem o elogio e a essência correspondentes a um varão santo. São as características de uma ancianidade perfeita.

…e esperava a consolação do povo de Israel.

   É muito adequado o comentário de Santo Ambrósio a esse respeito. O velho Simeão não procurava a graça tão só para si; ele a queria para todo o povo. Compreendia, portanto, dessa forma quão mais importante é a graça para a coletividade do que para uma só pessoa. Era um varão conhecedor do papel relevante da opinião pública.

   Era um homem de grande fé. Cria nas promessas de Deus. De grande discernimento, pois sabia ser a libertação do pecado o consolo do povo, e não o mero término das opressões estrangeiras.

O Espírito Santo estava com ele…

   É o que se passa com toda alma em estado de graça. Mas, aqui, São Lucas parece querer indicar algo de mais profundo, ou seja, destacar que se trata de um verdadeiro profeta, conforme melhor transparecerá mais adiante, na promessa recebida e no fato de ter sido guiado ao encontro com Jesus e Maria.

…e lhe havia anunciado que não morreria antes de ver o Messias que vem do Senhor.

   A promessa de ver a Cristo Jesus também nos foi feita. Para tal acontecer, é necessário imitar Simeão, ser justo, temer a Deus e esperar contra toda a esperança.

Movido pelo Espírito, Simeão veio ao Templo.

   Tratava-se de uma alma que havia alcançado os píncaros da união transformante. Deixava-se conduzir pelo Espírito.

Quando os pais trouxeram o Menino Jesus para cumprir o que a Lei ordenava…

   Não nos esqueçamos de que o esposo era senhor e dono de todo fruto de sua mulher. Jesus pertencia a José, e, assim, este era mais que um pai adotivo.

…Simeão tomou o Menino nos braços…

São Beda assim se expressa sobre esta passagem: “Aquele homem recebeu o Menino Jesus em seus braços, segundo a Lei, para demonstrar que a justiça das obras, que, segundo a Lei, estavam figuradas pelas mãos e os braços, devia ser substituída pela graça, humilde certamente, mas revigorante, de fé evangélica.

   Porém, nós ainda recebemos mais do que Simeão, pois, na hora da Comunhão, nossa união com Cristo é muito mais íntima. Que Simeão nos obtenha a graça de comungar diariamente como ele mesmo teria gostado de fazê-lo.

…e bendisse a Deus: “Agora, Senhor, conforme a tua promessa, podes deixar teu servo partir em paz;  porque meus olhos viram a tua salvação, que preparaste diante de todos os povos…”

   Mais uma vez transparece, por suas próprias palavras, a fidelidade desse varão. Certamente suas forças estiveram para abandoná-lo várias vezes. Quais não devem ter sido suas súplicas a Deus para que não falhasse em sua divina promessa? Quantas vezes não terá sido provado: “Será que agora morrerei sem ter visto o Messias?”.

   Não O vimos, nem O vemos, mas, na Eucaristia, podemos unir-nos a Ele mais intimamente do que Simeão. Que felicidade a nossa!

“…luz para iluminar as nações e glória do teu povo Israel”.

   Sim, as outras nações não haviam recebido a Revelação. A glória cabia ao povo judeu; aos demais devia ser concedido o conhecimento da chegada do Salvador. Nesse momento estavam a caminho os três Reis Magos, que dariam ocasião à manifestação da missão universal do Menino Deus, a Epifania.

O pai e a Mãe de Jesus estavam admirados com o que diziam a respeito d’Ele.

   Assim haviam estado ao constatarem as manifestações angélicas e a presença dos pastores na Gruta em Belém. A mesma admiração se repetirá na chegada dos Reis do Oriente. Discerniam ambos a glória futura da Civilização Cristã, promovida pelo oferecimento de Jesus.

Simeão os abençoou e disse a Maria, a Mãe de Jesus…

   Cabia-lhe abençoar, pois era da raça de Levi, sacerdote, portanto. É à Corredentora que ele se dirige.

Este Menino vai ser causa tanto de queda como de reerguimento para muitos em Israel. Ele será um sinal de contradição”.

  São Beda, o Venerável, assim se expressa: “Com júbilo ouvem-se essas palavras, que exprimem haver sido destinado o Senhor a conseguir a ressurreição universal, conforme o que Ele mesmo disse: ‘Eu sou a ressurreição e a vida; o que crê em Mim, ainda que esteja morto, viverá’ (Jo 11, 25). Mas quão terríveis soam aquelas outras palavras: ‘Este Menino vai ser causa tanto de queda como de reerguimento!’.

   “Verdadeiramente infeliz aquele que, depois de haver visto sua luz, fica, sem embargo, cego pela névoa dos vícios… porque, segundo o Apóstolo ‘melhor fora não terem conhecido o caminho da justiça, do que, depois de tê-lo conhecido, tornarem atrás, abandonando a lei que lhes foi ensinada’ (II Pd 2, 21).

   “Contradizem-No os judeus e gentios, e, o que é mais grave, os cristãos que, professando interiormente o Salvador, desmentem- No com suas ações”.

“Assim serão revelados os pensamentos de muitos corações”.

   Continua São Beda: “Antes da Encarnação, estavam ocultos muitos pensamentos, mas uma vez nascido na Terra o Rei dos Céus, o mundo se alegrou, enquanto Herodes se perturbava e com ele toda Jerusalém. Quando Jesus pregava e prodigalizava seus milagres, enchiam-se as turbas de temor e glorificavam o Deus de Israel; mas os fariseus e escribas acolhiam com raivosas palavras quantos ditos procediam dos lábios do Senhor e quantas obras realizava.

   “Quando Deus padecia na Cruz, riam com alegria néscia os ímpios, e choravam com amargura os piedosos; mas, quando ressuscitou dentre os mortos e subiu aos Céus, mudou- se em tristeza a alegria dos maus, e se converteu em gozo a pena dos amigos”.

   Ainda hoje e até o Juízo Final, os cristãos, outros Cristos, são “sinais de contradição” e, em função deles, revelar-se-ão os pensamentos escondidos nos corações de muitos.

“Quanto a Ti, uma espada Te transpassará a alma”.

   Maria é Corredentora do gênero humano. Essa profecia de Simeão, Ela já a conhecia. Mais ainda, estaria gravada em seu espírito até a ressurreição de Jesus. Ela é a Rainha dos Mártires e, desde a Anunciação, sofreria com Cristo, por Cristo e em Cristo.

   Nós somos convidados neste trecho do Evangelho a dar um caráter de holocausto às dores que nos forem permitidas pela Providência. Tenhamos amor às cruzes que nos cabem, unindo-nos a Jesus e a Maria nessa grandiosa cena da Apresentação.

Obra consultada:  DIAS, João S. Clá, O Inédito sobre os Evangelhos Vol VII, Libreria Editrice Vaticana, Città del Vaticano, 2013.


Fonte: Arautos do Evangelho em Recife